© REUTERS/Paulo Whitaker Juiz Sérgio Moro, em São Paulo |
CURITIBA E SÃO PAULO – Ao justificar a divulgação de conversa entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidente Dilma Rousseff, o juiz Sérgio Moro escreveu que “nem mesmo o supremo mandatário da República tem um privilégio absoluto no resguardo de suas comunicações”. A frase aparece em despacho publicado na manhã desta quinta-feira. Segundo Moro, a comunicação com Dilma foi interceptada “fortuitamente”, já que o investigado era Lula.
O juiz da 13ª Vara da Justiça Federal cita, ainda, um precedente da Suprema Corte norte-americana: o caso Watergate, que terminou com o afastamento do presidente Richard Nixon da presidência dos Estados Unidos em 1974. Nas palavras de Moro esse caso “é um exemplo a ser seguido”.
Moro afirma que determinou a interrupção do grampo de Lula às 11h12. Segundo ele, “entre a decisão e a implementação da ordem junto às operadoras” foi colhido novo diálogo, às 13h32. Moro afirma não ter reparado neste fato. “Como havia justa causa e autorização legal para a interceptação, não vislumbro maiores problemas no ocorrido”. Ele decidiu pela não exclusão do diálogo com Dilma do processo.
“A circunstância do diálogo ter por interlocutor autoridade com foro privilegiado não altera o quadro, pois o interceptado era o investigado e não a autoridade, sendo a comunicação interceptada fortuitamente”, diz o despacho. “Evidentemente, caberá ao Supremo Tribunal Federal, quando receber o processo, decidir definitivamente sobre essas questões.”
CASO WATERGATE
O caso citado por Moro em seu despacho envolve um dos mais célebres escândalos políticos ocorrido nos Estados Unidos. Nos anos 1970, reportagem do Washington Post mostrava que assessores do presidente do Partido Republicano Richard Nixon espionaram, em 1972, por meio do furto de documentos e da instalação de escutas ambientais sem autorização da Justiça. reuniões do Partido Democrata, adversário nas eleições que ocorreriam naquele ano e que acabariam sendo vencidas por Nixon. As reuniões ocorreram no Complexo Watergate.
Provas publicadas pelo Washington Post mostravam que o presidente Nixon sabia da espionagem. Ao longo das investigações oficiais, o promotor do caso pediu que fossem liberadas gravações feitas no Salão Oval da Casa Branca nas quais Nixon discutia o escândalo com seus advogados e assessores próximos, uma prova de que ele sabia do escândalo. O presidente alegou que, em virtude do seu cargo, ele tinha o direito de preservar o sigilo de suas conversas para salvaguardar os interesses nacionais.
A Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu, por 8 votos a 0, que o presidente não tinha esse privilégio e que deveria entregar as gravações para as investigações. Dias depois, em 9 de agosto de 1974, Nixon renunciou à Presidência.
ROTINA MANTIDA
Moro manteve a rotina normal no dia seguinte em que levantou os sigilos da interceptação telefônica envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidente Dilma Rousseff. Ele está na sede da Justiça Federal despachando e confirmou a participação em um seminário à noite. A segurança no local entrou em estado de prontidão.
Os agentes receberam um aviso que todos podem ser convocados a qualquer momento do dia caso seja necessário. Um grupo de manifestantes está na porta do edifício desde as primeiras horas da manhã em apoio ao juiz.
Moro chegou ao prédio por volta das 9h30 em um carro blindado da justiça escoltado por agentes da justiça e da Polícia Federal. Desde o início das investigações contra o ex-presidente Lula, a segurança do juiz e de seus familiares foi reforçada.
À noite, o juiz manteve a única agenda pública prevista para hoje. Ele é o palestrante principal do seminário “Combate à lavagem de dinheiro”, realizado pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil que será realizado em Curitiba.