Rio: ativistas trans vão desfilar na Sapucaí pela Paraíso do Tuiuti

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Xica Manicongo, considerada a primeira travesti não-indígena do país, foi uma mulher trans escravizada que viveu em Salvador, no século 16. Para contar sua história, que terminou igual a de muitas pessoas trans e travestis no Brasil, assassinada por LGBTfobia, a escola de samba carioca Paraíso do Tuiuti levará Manicongo à Marquês de Sapucaí.

O enredo da escola Quem tem medo de Xica Manicongo será desenvolvido pelo carnavalesco Jack Vasconcelos e contará com lideranças e ativistas trans desfilando na avenida, anunciados nesta Semana Nacional da Visibilidade Trans. Entre as convidadas, estão as parlamentares trans Érika Hilton (PSOL-SP) e Duda Salabert (PDT-MG), deputadas federais; a vereadora Amanda Paschoal (PSOL-SP) e a deputada estadual Dani Balbi (PCdoB-RJ), além de ativistas dos direitos humanos.

A deputada Erika Hilton disse que é uma honra participar do evento, que considerou uma oportunidade de contar a história de Manicongo. “Nós sempre estivemos no carnaval, pessoas trans e travestis, comunidade LGBTQIA+, mas faltava ter nossos heróis e heroínas’, disse. “Vai ser grandioso fazer o povo conhecer essa história e cantar ‘eu travesti’,” completou, em referência a trecho do samba-enredo.

“Eu espero que o maior recado seja dado: basta de preconceito, intolerância e ódio. Outras Xicas não podem mais ir para fogueira”, ressaltou Erika Hilton.

Ativismo

Entre as ativistas, está Indianarae Siqueira, fundadora da CasaNem, um centro de cidadania e acolhimento para pessoas LGBTQIA+. Ela disse que o convite da Tuiuti reconhece uma trajetória de lutas e destaca a responsabilidade da comunidade, no Brasil, em defender políticas públicas, como um farol para o mundo, em meio aos ataques do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, contra transgêneros. 


 A ativista LGBT Indianara Siqueira, coordenadora da Casa Nem, um dos grupos que atualmente ocupa do  edíficio abandonado Almeida Rêgo, na Rua Dias da Rocha 27, em Copacabana, onde foi encontrado acervo com animais empalhados, ossadas, bustos e

Indianara Siqueira Arquivo/ Fernando Frazão/Agência Brasil

Nos últimos dias, o mandatário tomou medidas para restringir direitos de pessoas trans, como o banimento delas das Forças Armadas e a proibição de mulheres trans cumprirem pena em prisões femininas, apesar de dados do próprio governo mostrarem que essas mulheres têm mais chances de sofrer crimes sexuais na cadeia. 

“Quando o presidente dos Estados Unidos faz ataques à nossa comunidade, ele declara ao mundo que reconhece a nossa existência, porque você só ataca o que existe”, declarou. Indianarae lembrou a importância de organizações como Minha Criança Trans, a RedTransBrasil e a própria Casa Nem, que faz atendimento noturno às LGBTQIA+ em situação de rua ou qualquer outra forma de vulnerabilidade.

Ao lado de Indianarae desfilarão Keila Simpson, ativista e 1ª travesti doutora honoris causa do país pela UERJ; Gilmara Cunha, ativista LGBTQIA+; Megg Rayara, 1ª travesti negra a alcançar o título de doutorado no país, pesquisadora, professora da UFPR e Symmy Larrat, 1ª travesti secretaria nacional LGBTQIA+ do governo federal.

Homenagem

Ao homenagear Xica Manicongo, a Paraíso do Tuiuti populariza a história da escravizada trans que trabalhou como sapateira em Salvador. Os relatos históricos indicam que ela não aceitava o nome masculino, tampouco, os trajes masculinos e se vestia de acordo com sua identidade de gênero, como mulher, com um pano amarrado ao corpo.

Xica foi violentamente reprimida pela época, acusada de sodomia e condenada à morte pelo Tribunal do Santo Ofício, queimada viva em praça pública, o que mostra as raízes coloniais da violência contra essa população e que se perpetua até os dias de hoje.

O Brasil permanece na lista dos países que mais mata pessoas trans. Ao todo, 122 indivíduos desse grupo foram assassinados no país, em 2024, sendo cinco defensores de direitos humanos, segundo a mais recente edição do dossiê da Associação Nacional de Trans e Travestis (Antra). O levantamento foi divulgado na última segunda-feira (27). O número difere pouco de levantamento dos anos anteriores, quando a média de assassinatos de pessoas trans foi de 125, entre 2008 e 2024, segundo a Antra. 

Assim, o enfrentamento à violência é um ponto central das reivindicações de políticas públicas contra a transfobia. Em entrevista recente à Agência Brasil, a presidenta da Antra, Bruna Benevides, disse ser evidente que a desigualdade social e a restrição às políticas públicas “são fatores de risco” de morte para a comunidade de pessoas travestis e transexuais. “Quanto menos políticas públicas, mais retrocesso”.


Rio de Janeiro (RJ) 15/11/2024 – Bruna Benevides, presidente da Antra, na mesa da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT) no G20 Social, sobre tragédias Ambientais e o impacto para a população LGBTI+, no Espaço Kobra. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Bruna Benevides Arquivo/Fernando Frazão/Agência Brasil

Fabián Algarth, coordenador nacional do Instituto Brasileiro de Transmasculinidades (IBRAT) e representante do Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+ lembrou que o direito à vida  consta da Constituição Federal.

Em respostas aos ativistas, a ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania, Macaé Evaristo, assinalou que “o Estado não é um bloco só” e que é necessário a atuação de parlamentares comprometidos com direitos humanos para “transformar a cultura política tão autoritária”. Ela reforçou que esta agenda deve ser de toda a sociedade.

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